domingo, 27 de setembro de 2009

Sobre Religiões

Cada religião reclama ser a representante de Deus na Terra. Que suas verdades, seus símbolos e toda sua doutrina são comunicadas diretamente por Ele e que por isso não merecem retoques, principalmente aqueles retoques que de forma aberta ou velada lhe são antagônicos. Fato é que muitas arrotam arrogantemente seu desprezo pelo que não é “si mesmo” e pelo que é “ o outro”. E se algumas delas não fazem isso é porque deixaram de ser religião para ser a expressão tranqüila e serena da face daquele que com transparência e profunda sobriedade, acolhe a todos sem distinção alguma, sem os usurpar o direito de serem eles mesmos. Talvez seja daí que nasça a verdadeira religião. Uma religião profundamente solidária ao sentido comum que todos temos na caminhada da vida, querendo ou não; uma religião que nos ensine os segredos de uma convivência pacífica e fraterna; que nos faça homens, mulheres, crianças, idosos, brancos, negros, ou quem quer que sejamos ou em que acreditemos, melhores.
Imaginar Deus entrelaçado por uma religião, onde essa seja a expressão máxima de Sua vontade, seria imagina-lo menor em sua grandeza e um grande delírio de nossa parte. Deus é de tal natureza que nenhuma religião seria capaz de dizê-lo sem ao menos confundi-lo com seu alterego. Muito menos todas elas. E no fundo quando uma religião, sem nenhuma consciência de sua própria ambigüidade, absolutiza sua fala e sua representação de Deus, nada mais quer que a dominação daqueles que ouvem o seu discurso.
Deixando de lado os apriorismos que cada qual levanta em sua defesa, quem notadamente encontra o Deus verdadeiro não possui a necessidade de dize-lo seu, mas, sobretudo, de dizer-se por Ele na nova vida em que se descobre. Percebe também que Ele não se detém particularmente em nenhuma religião, mas que o local inarredável de Sua presença é onde o amor emerge como a experiência do outro. E cá que se faz a verdadeira religião; o espaço inconfundível do verdadeiro Deus; um espaço onde os olhos cansados de lágrimas e de dor reencontram o seu brilho perdido; um espaço que muda a face pesada da desconfiança, sulcada pelos elementos trágicos da vida, no sorriso largo de uma criança. Essa religião não busca nenhuma forma de poder. Pelo menos não o poder como força de dominação e exploração de seus fiéis. Seu único poder é poder como possibilidade e caminho. Ao contrário das outras, que se revestem de suas doutrinas e dogmas, escondendo assim sua nudez, mas que apesar disso tem consciência de estarem nuas, aquelas se desnudam se nenhum pudor ou constrangimento, translúcidas a investigação de qualquer um. Não se escondem. Pelo contrário, é na sua nudez que emerge sua doutrina e sua verdade. Caminha nua, mas tranqüila. E sua tranqüilidade advém da experiência da realidade que a cerca e não de que forma tenta usar ou desconstruí-la em função da manutenção de seu status quo.
É dessa religião que precisamos – o amor que se nos revela em Jesus de Nazaré– que nos desnuda ante o outro e nem por isso faz corar nossas faces. Portanto, nos orgulhamos de uma nudez bem vivida como des-abrochar de uma nova vida.

Glauco Kaizer

Um comentário:

  1. Caríssimo
    Fico feliz em saber que encontras em Jesus de Nazaré a fonte de inspiração da sua vida. E de que reconheces que nenhum religião, por mais importante que seja, é capaz de esgotar o mistério de Salvação trazido por esse homem-Deus. Espero que possamos compartilhar bastante da nossa fé comum, vivida em instituições religiosas diferentes, mas que é capaz de nos conduzir pelo mesmo caminho de vida. Abraços. Paz! Marcos (mestrado PUC).

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